Espírito e tempo


(Salvador Dalí. A persistência da memória, óleo sobre tela, 1931) (Reprodução)
 

Desde as origens da humanidade, o tempo, na forma de questionamentos sobre temporalidade, o passar do tempo ou o infinito incomodam o homem.

O tempo, conquanto estudado por amplas vertentes, não encontra conciliação entre filósofos, religiosos, cientistas ou literatos.

Para os sábios da antiguidade, o tempo poderia ser como uma roda ou como uma flecha.

A roda seria o tempo cíclico, rotativo, enquanto a flecha expressaria o tempo contínuo, progressivo.

Nas palavras de Heráclito, “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”, porque no banho seguinte não são iguais nem a pessoa, nem mesmo o rio.

Isaac Newton, em Principia, apresentava o tempo como absoluto, verdadeiro e matemático, que flui sempre igual por si mesmo e por sua natureza, sem relação com coisa externa.(1)

O tempo de Newton é uniforme, independente de objetos externos ao observador.

Já Kant afirma que o tempo é a forma real da intuição interna.(2)

Nestas especulações vemos duas vertentes distintas: o tempo matemático e uniforme em contraposição ao produto da intuição.

Inúmeras são as elaborações filosóficas, mas vamos nos deter nas considerações da doutrina espírita.

Allan Kardec nos aponta o caráter relativo da experiência do homem frente ao tempo:

“O tempo é apenas uma medida relativa da sucessão das coisas transitórias.” (3)

Ernesto Bozzano, em “A Crise da Morte”, Duodécimo Caso, cita relato mediúnico de “Cartas de Blaire”:
“Apercebi-me, em seguida, de que já não tinha nenhuma ideia do tempo, não chegando a fazer um conceito exato do meu passado, do meu presente e do meu futuro. Com efeito, essas categorias do vosso tempo se me apresentavam à mente de maneira simultânea.”
Considera Bozzano que “na subconsciência humana, existem, em estado latente, maravilhosas faculdades supranormais, capazes de devassarem o passado, o presente e o futuro, sem nenhuma limitação de tempo, nem de espaço”. Concluindo, em seguida: “No mundo espiritual, a noção de tempo deixa de existir.” (4)

A interação do Espírito com o tempo se mostra diretamente relacionada à densidade material do orbe em que nos situamos. O agente que o elabora é a mente, centralizadora de fenômenos e de sensações.

“O tempo somente se torna realidade por causa da mente, que se apresenta como o sujeito, o observador, o Eu que se detém a considerar o objeto, o observado, o fenômeno.
Esse tempo indimensional é o real, o verdadeiro, existente em todas as épocas, mesmo antes do princípio e depois do fim.
Aquele que determina as ocorrências, que mede, estabelecendo metas e dimensões, é o relativo, o ilusório, que define fases e períodos denominados ontem, hoje e amanhã, através dos quais a vida se expressa nos círculos terrenos e na visão lógica – humana – do Universo.” (5)

Em nossa permanência no corpo físico, nos encontramos vinculados a sensações, propriedades e restrições inerentes à dimensão material. No mundo terreno, a ciência já observou e postulou inúmeras propriedades, que perscrutaram desde o íntimo do átomo ao esplendor das estrelas que vagam no infinito.
Tempo é um padrão usado em nosso mundo para marcar a alternância de estações, períodos de plantio e colheita etc. Na espiritualidade não vigora nosso paradigma temporal, mas relações específicas de um plano etéreo e distituído de matéria bruta como a que experimentamos.

O entendimento do tempo pauta-se pela imprecisão de nossas sensações, sendo fator de incômodo enquanto encarnados, e também de perda das referências terrenas durante a erraticidade.

Notas:

1-WHITROW, G.J. O tempo na história. Rio de Janeiro: Zahar, 1993, p.147.

2-FIGUEIREDO, Vinicius Berlendis. Kant e a crítica da razão pura. Rio de Janeiro: Zahar, 2ª ed., 2010, p.30.
3-KARDEC, Allan. A Gênese, cap. 6, it.2.
4-BOZZANO, Ernesto. A crise da morte.
5-FRANCO, Divaldo Pereira. Impermanência e imortalidade. Rio de Janeiro: FEB, “Tempo, mente e ação”, 2005.

A alma dos animais

Public Domain Pictures (Reprodução)

Antes de entrarmos no mérito da questão, necessário se faz a conceituação da palavra alma, para que nosso pensamento seja claro e objetivo, embasado no bom-senso kardequiano, através da magistral “Introdução ao Estudo da Doutrina dos Espíritos”, inserida em “O Livro dos Espíritos”, onde no inciso II, explica o Codificador Espírita:

“Segundo uns, a alma é o princípio da vida material orgânica. Não tem existência própria e se aniquila com a vida: é o materialismo puro”.

Com esta conceituação de alma, poderíamos dizer que as plantas, os animais e os homens teriam alma, mas incorreríamos em erro, pois com essa opinião estaríamos fazendo da alma efeito e não causa. Outra opinião seria:

“Pensam outros que a alma é o princípio da inteligência universal do qual cada ser absorve uma certa porção”.

Com esta opinião, espiritualista panteísta, descartaríamos o materialismo, mas, não resolveríamos a questão, pois, seríamos como gotas no oceano, sem individualidade, sem consciência de nós mesmos, seríamos centelhas da grande alma universal. Apesar de diferir da opinião procedente por não confundir princípio vital com princípio espiritual, os profitentes desta crença não explicam, complicam, pois confundem o todo com as partes ou o contrário se preferirem.

E para finalizarmos vamos a terceira opinião:

“Segundo outros, finalmente, a alma é um ser moral, distinto, independente da matéria e que conserva sua individualidade após a morte”.

Sem dúvida esta é a opinião mais aceita e vai ao encontro das crenças instintivas, aceita na antiguidade e atestada por historiadores e antropólogos. Nem materialismo, nem panteísmo, mas espiritualismo, porque a alma deixa de ser efeito e passa a ser causa.

Daí conclui o Codificador:

“A fim de evitar todo equívoco, seria necessário restringir-se a acepção do termo alma a uma daqueles idéias. A escolha é indiferente;o que se faz mister é o entendimento, entre todos, reduzindo-se o problema a uma simples questão de convenção. Julgamos mais lógico tomá-lo na sua acepção vulgar e por isso chamamos ALMA ao Ser imaterial, e individual que em nós reside e sobrevive ao corpo”.

Diante do exposto podemos avaliar a questão, concluindo que o termo “alma”, é ambíguo, pois, não expõe uma opinião ou sistema, mas sim, um proteu, como expõe o Codificador espírita nas linhas claras e precisas do seu pensamento.

E para maior clareza da tese em questão, Allan Kardec, o Espírita por excelência, encerra este assunto polêmico com as palavras:

“Evitar-se-ia igualmente a confusão, embora usando-se do termo alma nos três, desde que se lhe acrescentasse um qualificativo especificando o ponto de vista em que se está colocado, ou a aplicação que se faz da palavra. Esta teria, então, um caráter genérico, designando, ao mesmo tempo, o princípio da vida material, o da inteligência e o do senso moral, que se distinguiriam mediante um atributo, como os gases, por exemplo, que se distinguem aditando-se ao termo genérico as palavras hidrogênio, oxigênio, ou azoto. Poder-se-ia, assim, dizer, e talvez fosse o melhor, a alma vital – indicando o princípio da vida material; a alma intelectual – o princípio da inteligência, e a alma espírita – o da nossa, individualidade após a morte. Como se vê, tudo isto não passa de uma questão de palavras, mas questão muito importante quando se trata de nos fazermos entendidos. De conformidade com essa maneira de falar, a alma vital seria comum a todos os seres orgânicos: plantas, animais e homens; a alma intelectual pertenceria aos animais e aos homens; e a alma espírita somente ao homem.”

Se as instruções dadas por Allan Kardec, fossem incorporadas no estudo metódico de todas instituições espíritas, questões como essa, não seriam motivo para discussões intermináveis dos detentores da palavra inflamada que incendeia os meios ditos espíritas, que valoriza o romance preterindo as obras básicas da Codificação em completo alienamento da Doutrina Espírita.

Mas, afinal, os animais tem alma?

Deixaremos a resposta em pauta, para os Espíritos superiores, que nas questões 597 e 598 de “O Livro dos Espíritos”, diante das perguntas de Kardec, advertem:

“Pois que os animais possuem uma inteligência que lhes faculta certa liberdade de ação, haverá neles algum princípio independente da matéria?

– Há e que sobrevive ao corpo.

Será esse princípio uma alma semelhante à do homem?

– É também uma alma, se quiserdes, dependendo isto do sentido que se der a esta palavra. É, porém, inferior à do homem. Há entre a alma dos animais e a do homem distância equivalente à que medeia entre a alma do homem e Deus.

Após, a morte, conserva a alma dos animais a sua individualidade e a consciência de si mesma?

“Conserva sua individualidade; quanto à consciência do seu Eu, não. A vida inteligente lhe permanece em estado latente.”

Sem comentários, encerramos, esperando que o bom-senso kardequiano e a sabedoria dos Espíritos superiores, ilumine nossa casa mental, tocando os nossos corações, porque somos seres em evolução e o que realmente importa é o respeito a vida em todos os níveis.

Bernardino da Silva Moreira

(CORREIO FRATERNO DO ABC, Ano XXXIV, Nº 370, Novembro de 2001 e republicado no Nº 374, Março de 2002 apud Portal do Espírito)

DOUTRINA ESPÍRITA E O CONGELAMENTO DE CORPOS

(Reprodução)

A humanidade sempre alimentou o sonho de prolongar a vida e postergar o momento da morte.
O uso de baixas temperaturas com fins medicinais teria surgido ainda na Antiguidade, cerca de 2500 a.C, no Egito.
James Arnott, em 1845, emprega pela primeira vez a criocirurgia.
Em 1946, na Inglaterra, Christopher Polge e Smith descobrem o glicerol, substância crioprotetora (usada na preservação celular)
Christopher Polge, em 1949, usa o glicerol para preservação de células (sêmen de touro)
No ano de 1960, Robert Ettinger escreve “Prospecto da Imortalidade”, defendendo que, com a Criogenia, a morte se tornará reversível.

Nos anos 1970, surgiram nos Estados Unidos clínicas de criogenia, propondo preservar os corpos de pessoas com doenças incuráveis, a pretexto de serem descongelados no futuro, quando a ciência conquistar a cura para suas enfermidades. No início do século 21, as empresas remanescentes contavam com algumas dezenas de pessoas conservadas por criogenia, ao custo de 100 a 150 mil dólares. Contudo, após meio século de difusão da criogenia, não há caso de pessoa que tenha sofrido o congelamento de seu corpo sendo posteriormente descongelada e vivificada por tais clínicas. A imortalidade do congelamento permanece entre os sonhos do homem.

CRIOGENIA é palavra que vem da combinação de dois verbetes gregos: Kryos, frio, e gennao, nascido.  É a parte da Física que se dedica à produção e manutenção de baixas temperaturas e ao estudo das propriedades da matéria e dos sistemas a elas submetidos. Suas pesquisas focam as criotemperaturas próximas do zero absoluto (-273,16 ºC). (cf. Grande Enciclopédia Larousse Cultural, 1998, p. 1692)

CRIOBIOLOGIA – é o estudo da vida a baixas temperaturas.
CRIÔNICA – é a preservação a baixas temperaturas de humanos ou mamíferos com o objetivo de serem reanimados no futuro. Não é considerada parte da Criobiologia.

CRIOPRESERVAÇÃO – é a tecnologia em que células, tecidos ou embriões são preservados por arrefecimento a baixas temperaturas.

MÉTODOS DE CRIOPRESERVAÇÃO

Em todos os processos pesquisados, colhe-se tecidos (amostras de células), que são colocadas em um meio líquido.

1-Congelamento lento e progressivo. As células são submetidas a, pelo menos, quatro estágios de temperatura: -10°C, -20°C, -30 a -60°C, -196º, passando desde a formação de cristais de gelo até a vitrificação da água intracelular;

2-Congelamento rápido. Com o uso de crioprotetores, partes da célula (citoplasma) são protegidas. Submete-se a amostra a poucos estágios de congelamento: -30° a -60°C; e -196º. Forma-se gelo intracelular, contudo as estruturas da célula são destruídas;

3-Congelamento ultra-rápido. As células ou tecidos são imersos em pequena quantidade de líquido e passam por um acelerado estágio de redução de temperatura a -196°C, ocorrendo vitrificação dos líquidos intracelulares e formação de gelo.

O CONGELAMENTO DE CORPOS
1º-O corpo é levado para a clínica de criogenia;
2º-Todo o sangue e o plasma são retirados e substituídos por crioprotetores (líquidos conservantes) e anticongelantes;
3º-Imersão do corpo em um tanque com 200 litros de gás Nitrogênio a -196º C.

Chico Xavier, pelo Espírito Emmanuel, no livro “Lições de Sabedoria”, Editora Folha Espírita, p. 45, comenta:

“O congelamento do corpo ocupado pelo Espírito, em processo desencarnação, pode retê-lo, por algum tempo, junto à forma física, ocasionando para ele dificuldades e perturbações. Isso, de algum modo, já sucedia no Egito Ancião, quando o embalsamamento nos retinha, por tempo indeterminado, ao pé das formas que teimávamos em conservar. Semelhante retenção, porém, só se verifica na pauta da lei de causa e efeito.

E, quanto ao congelamento, se algum dos interessados — por força da provação deles mesmos — retomarem o corpo frio a fim de reaquecê-lo, a Ciência não pode assegurar-lhes um equipamento orgânico claramente ideal como seria de desejar, especialmente no tocante ao cérebro que o congelamento indeterminado deixará em condições por agora imprevisíveis.”

Chico Xavier, pelo Espírito André Luiz, “Nos Domínios da Mediunidade”, cap. 11, registra:

“(…) o perispírito, ou “corpo astral”, é revestido com os eflúvios vitais que asseguram o equilíbrio entre a alma e o corpo de carne, conhecidos aqueles, em seu conjunto, como sendo o “duplo etérico”, formado por emanações neuropsíquicas que pertencem ao campo fisiológico (…) destinando-se à desintegração, tanto quanto ocorre ao instrumento carnal, por ocasião da morte renovadora.”

Eurípedes Kuhl esclarece:

“Criogenização” já vem sendo largamente feito, com células e embriões.

Mas entre um caso e outro, há uma diferença fundamental: o material mantido criogenizado em laboratório apresenta a condição de estar “ativo” no momento da criogenização, isto é, não danificado, em perfeitas condições naturais. No cadáver estas condições inexistem, pois a morte desencadeia total e irreversível cessação do metabolismo.

Para nós, espíritas, é penoso imaginar que uma pessoa, em vida, desconhecendo totalmente a existência do Plano Espiritual, e principalmente dos mecanismos divinos da vida, consubstanciados nas vidas sucessivas (reencarnação), tenha a preocupação de cuidar do “ressuscitamento” de seu corpo, após a morte (quase sempre causada por doença incurável), mantendo-o congelado, com a expectativa de que num futuro próximo ou distante venha a obter cura pela Medicina e volte a viver…”

Irene Pacheco Machado, pelo Espírito Luiz Sérgio, em “Lírios Colhidos” cita um Espírito que, estando com sofrimento nessas condições (congelamento do seu corpo físico doente, após a morte, com vistas a futura cura e respectiva ressurreição), teve que ser levado a banhos de sol, por bondosos assistentes de uma Colônia do Plano Espiritual, para “derreter o gelo” ao qual ele se sentia preso, congelado.

CONCLUSÃO

A criopreservação é a aplicação de princípios da criogenia com a promessa de preservar a vitalidade de tecidos, embriões, órgãos e corpos de animais e pessoas.

O uso de baixíssimas temperaturas propõe a preservação celular, impedindo sua degradação molecular e biológica.

Conquanto se possa adiar por longo tempo a morte de células, tecidos e corpos, a vitalidade depende de fatores que não se limitam a características materiais, mas também fluídicas. O perispírito, corpo sutil que intermedia a ligação do espírito com o corpo material, é dependente de energia e de condições fluídicas aptas a preservar sua ligação entre os corpos energético, semi-material e material.

Por mais aperfeiçoadas que sejam as condições de manutenção do veículo material, a ciência terrena ainda não domina as propriedades e multiplicidade de funções do perispírito, entre as quais as relacionadas ao equilíbrio fluídico entre os corpos que constituem o homem e se mantêm ao longo do período da encarnação.

-BIBLIOGRAFIA:

Congelar a morte, um debate americano. Disponível em: <http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=3613>.

JORGE, MELINA PEREIRA, “CRIOGENIA SOB A ÉGIDE LEGAL BRASILEIRA”. Marília: Fundação de Ensino “Eurípedes Soares da Rocha”, Centro Univ. “Eurípedes de Marília”, UNIVEM, 2007.

Kauffmann-Zeh, Andrea. “Corpos congelados, o jeito de não morrer”, http://galileu.globo.com/edic/115/ensaio.htm

Pereira, Robson. “O mercado pós-vida explode na internet”.

<http://www.sincep.com.br/noticias/273.asp>.

Versignassi, Alexandre. “O que é criogenia humana?”, disponível em: http://mundoestranho.abril.com.br/ciencia/pergunta_286711.shtml

-FILMES QUE ABORDAM O TEMA:

-“2001:Uma odisséia no espaço” (1968);

-“Austin Powers: um agente nada discreto” (1997);

“Eternamente Jovem” (1992);

-“O Dorminhoco” (“Sleeper”) (1973).

Mundo material e sua estrutura

 

(Joseph Wright of Derby, “O alquimista descobrindo o fósforo”, 1771) (Reprodução)

Átomo Divino

Se você, leitor amigo, queimar lenha, observará vários fenômenos, que ocorrem na combustão:

Chamas – o fogo a se expandir.

Estalos – a água a ferver.

Fumaça – o ar a se agitar.

Cinzas – a terra a absorver.

Teríamos, portanto, quatro elementos primordiais:

Fogo, água, ar e terra.

Essa a teoria de Empédocles (490-430 a.C.), filósofo grego. Concebia que, a partir deles, ocorrem todos os fenômenos físicos e se formam os todos seres da Natureza, na fauna e na flora.
Deu o nome de raízes a esses elementos.
De suas combinações tudo nasceria e pereceria.
Empédocles pode ser considerado um precursor da teoria evolucionista de Charles Darwin (1809-1882), que situa o aparecimento do Homem como a culminância de longa jornada evolutiva.
Teve início com o esfriamento da crosta terrestre e o aparecimento de organismos elementares que se desenvolveram em complexidade ao longo de bilhões de anos, até atingir a complexidade necessária ao aparecimento do homo sapiens.
Para um arranjo melhor de sua teoria, faltou a Empédocles assimilar as idéias de Demócrito (460-370 a.C.), seu contemporâneo, que dizia ser a matéria constituída de microscópicas partículas – os átomos.
Ar, fogo, terra e água seriam arranjos atômicos e não elementos básicos da matéria.

***

Além de estudioso dos fenômenos naturais, Empédocles era uma alma sensível.
Guardava poética visão do Universo.
Imaginava que os quatro elementos combinam-se ou se separam, a partir de duas forças imutáveis – o amor e o ódio.
Representam a convergência e a divergência, o bem e o mal.
A Doutrina Espírita nos oferece uma visão mais realista.
Os fenômenos naturais, mesmo aqueles que implicam em desagregação, como a morte, não se subordinam aos embates de forças antagônicas, agregadoras ou desagregadoras.
Obedecem à regência de leis divinas, segundo os desígnios insondáveis do Criador.
Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec concebe, sob inspiração dos mentores que o assistiam, uma Lei de Destruição que é sinônimo de renovação.
A questão 728 esclarece:

Preciso é que tudo se destrua para renascer e se regenerar. Porque, o que chamais destruição não passa de uma transformação, que tem por fim a renovação e a melhoria dos seres vivos.

Nesse contexto, a única força desagregadora é o ser pensante da Criação, quando pretenda sobrepor-se aos desígnios divinos, enveredando por tortuosos caminhos de rebeldia.
Compromete-se, então, com sentimentos negativos como o ódio, a ambição, a inveja, o ciúme, passíveis de conturbar o ambiente em que se situa e aqueles com quem se relaciona.
Mas, ainda que detenha atilada inteligência e optando por guerrear a obra divina, assumindo a postura de um ser demoníaco, o Espirito jamais supera os limites de sua condição – a criatura diante do Criador, o relativo subordinado ao Absoluto.

***

Os átomos que compõem um pedaço de madeira podem arder em chamas, entrar em ebulição, difundir-se no ar, derramar-se em cinzas na terra, mas permanecerão íntegros em sua essência, aptos a compor outras formas.
Também o Espírito, ainda que se deixe arder em paixão, ferver em desatino, expandir-se em inconseqüência ou reduzir-se à indiferença, jamais perderá sua condição de átomo divino, destinado a brilhar na glória da Criação, sob as bênçãos de Deus.
Como tal, é regido por leis soberanas que disciplinam suas emoções e renovam suas idéias, reajustando seus caminhos e reconduzindo-o aos roteiros do Bem.
Assim, mesmo os seus desatinos acabarão por funcionar em seu próprio benefício, porquanto colherá sempre as conseqüências de suas iniciativas.
Aprenderá, à custa de sofrimentos e dores, a corrigir seus impulsos, ajustando-se à harmonia do Universo para atingir sua destinação suprema:

Co-participante na obra divina, filho perfeito de Deus!

RICHARD SIMONETTI, in “Luzes no Caminho”.

Victor Hugo e os fenômenos mediúnicos

Contatos do escritor Victor Hugo com espíritos são tema de exposição em Paris

ALCINO LEITE NETO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

Em 1852, o escritor francês Victor Hugo (1802-1885), autor de livros como “Os Miseráveis” e um dos maiores poetas de todos os tempos, exilou-se na ilha de Jersey, entre a França e a Inglaterra, por motivos políticos.

Ali, viveu um episódio muito controverso da história cultural francesa.

(Reprodução)

Ectoplasma sai da boca de mulher em sessão mediúnica de 1918


Ectoplasma sai da boca de mulher em sessão mediúnica de 1918

Realizou, entre 1853 e 1855, inúmeras sessões de mesa falante (ou girante), a fim de se comunicar com espíritos –com sua filha Léopoldine, que havia morrido aos 19 anos, em 1843, afogada no Sena, mas também com William Shakespeare (1564-1616) e Dante (1265-1321).

Essa experiência é tema de uma interessantíssima exposição em cartaz (até 20 de janeiro) no museu Maison de Victor Hugo, em Paris: “Entrée des Médiums – Spiritisme et Art d’Hugo à Breton”.

O título, “Entrada dos Médiuns”, vem de um texto do escritor André Breton (1896-1966), líder do surrealismo, movimento literário e artístico que se interessou pelos fenômenos mediúnicos e chamou a atenção para a obra de médiuns-pintores.

PARANORMAIS

A primeira parte da mostra trata das relações de Hugo e sua família com o espiritualismo, expondo desenhos do poeta, fotos feitas por seu filho (e principal médium) Charles Hugo, além de manuscritos com as transcrições de mensagens colhidas na mesa falante de Jersey.

A segunda e a terceira partes trazem trabalhos de artistas-médiuns e de médiuns-artistas, todos eles pouco conhecidos e em geral classificados como “art brut”, tais como Fernand Desmoulin (1853-1914), Victorien Sardou (1831-1908) e Hélène Smith (1861-1929), por exemplo.

O principal interesse da sessão sobre a metapsíquica (corrente de estudos criada pelo cientista Charles Richet com a finalidade de pesquisar fenômenos paranormais) é a série de fotos da médium Marthe Béraud expelindo ectoplasmas (materializações de espíritos).

As imagens são extraordinárias, “verdadeiras esculturas conceituais”, nas palavras de Gérard Audine, diretor do museu.

As relações intensas, mas pouco ortodoxas, dos surrealistas com a metapsíquica, a vidência e o espiritismo concluem a mostra, com obras de Robert Desnos (1900-1945), André Masson (1896-1987), Yves Tanguy (1900-1955) e outros.

Além de incomum, a exposição é audaciosa por abordar temas e crenças que sempre são tratados com muita discrição na França –pátria de Voltaire (1694-1778), mas também de Allan Kardec (1804-1869).

(Folha de S.Paulo, Ilustrada, 28/12/2012, p.C-5)

A questão ciência x fé

(Urano)  (Reprodução)

Ciência e fé: realidades paralelas

O que irrita os cientistas, ao menos os que são ateus, é a insistência dos que têm fé em crer em algo inacessível

No perene debate entre a ciência e a religião, algo que costuma irritar os cientistas, ao menos aqueles que se consideram ateus, é a insistência dos que têm fé em acreditar numa realidade paralela, inacessível à razão. Vejamos isso num diálogo fictício entre um cientista ateu e uma pessoa de fé bem versada nos avanços da ciência.

Cientista: “Uma causa sobrenatural não faz sentido: se for sobrenatural, isto é, além dos limites do espaço e do tempo, das leis da natureza, do material, como podemos saber da sua existência?

Afinal, o que existe tem de ser detectado. Caso contrário, essa existência é uma fabricação, uma fantasia. Pior ainda, se essa causa se manifestar naturalmente, através de uma ‘visão’ ou de um fenômeno qualquer, vira uma causa natural, que pode ser estudada pelos métodos da ciência. Ou seja, se algum deus existe, é impossível saber da sua existência de forma concreta. E não existe outra forma de saber”.

Pessoa de fé: “A coisa não é assim tão simples, preto ou branco, existe ou não existe.

Entendo que, dentro do método científico, algo precisa ser detectável para que se comprove que é real. Ninguém sabia da existência de Urano até sua detecção por William Herschel em 1781. Mas, antes da detecção, Urano existia ou não? Claro que sim, mesmo que não soubéssemos disso. A ciência não pode determinar com firmeza o que não existe, apenas o que existe”.

Cientista: “Mas você não pode, não deveria, comparar Deus a um objeto celeste. Pelo que entendo, Sua existência não passa pelas leis da natureza. Se passasse, Deus seria um fenômeno natural e deixaria de ter essa transcendência de que vocês tanto gostam e que ajuda a crença. Se Deus se ‘esconde’ numa realidade paralela, jamais fará parte do cânone da ciência”.

Pessoa de fé: “Sem dúvida, Deus jamais fará parte do cânone da ciência. Esse é o seu problema, tudo tem de ser parte desse cânone. E eu já não penso assim.

Existem coisas que estão além da ciência, coisas que a ciência não tem como e nem deveria tentar explicar. A ciência tem um método bastante claro de estudo, separando o objeto a ser estudado do todo. Esse método supõe que a separação pode ser feita. Isso funciona muito bem no laboratório, ou quando um astrônomo observa uma galáxia.

Mas como explicar, por exemplo, o Universo como um todo, a questão da origem de tudo? Como olhar para o Universo como um objeto de estudo, se não podemos sair dele?”.

Cientista: “Esse é o problema mais complicado, que os filósofos gostam de chamar de Primeira Causa, e os físicos, de ‘condições iniciais’. Verdade, temos sempre de supor um contexto para oferecer uma explicação. Não temos ainda uma lei que explique como selecionar uma condição inicial dentre as várias possíveis. Mas nem por isso devemos supor que a explicação é sobrenatural, obra de uma entidade que não podemos saber se existe. Que tipo de explicação é essa?”.

Pessoa de fé: “Essa é a explicação pela fé, além da ciência”.

Cientista: “Eu prefiro continuar tentando entender do meu jeito”.

Pessoa de fé: “Boa sorte, que Deus te inspire”.

Cientista: “Eu prefiro me inspirar sozinho mesmo”.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor de “Criação Imperfeita”

(Folha de S.Paulo, Ciência, 7/10/2012)

Congelamento de corpos

NO CONGELAMENTO DOS CORPOS, A ILUSÃO

Sempre que volto à Colônia onde moro procuro olhar ao meu redor para sentir a beleza da natureza e, feliz, busco a companhia das flores e dos pássaros. Olhando tudo sinto o quanto Deus é bom.

A maioria dos encarnados, por julgar que a morte é o fim da estrada, não se preocupa em agir corretamente e se auto-destrói. E a vida é contínua, um rio de oportunidades cujas águas um dia chegarão a Deus. Até lá, temos por obrigação nos tornarmos puros. Muitos, vivendo somente o hoje por julgarem que no amanhã só existe o nada, não preparam uma bagagem digna. Quando chega a “morte”, o espírito, completamente perturbado, se sente muito infeliz, não se conforma com a realidade do mundo espiritual e só pensa em viver junto aos encarnados, não percebendo o mal que faz a si próprio. Nisso Joana aproximou-se de mim:

— Sérgio, por que a preocupação?

– Encontrava-me somente pensando como pode um homem não aceitar a imortalidade da alma. Quem assim pensa não crê em Deus, apenas recita o Seu nome em vão.

Se Deus destruísse as Suas obras Ele não seria perfeito, portanto, não possuiria bondade. E quantos que se dizem crentes nas Suas palavras esperam a hora do descanso eterno.

— Mas é difícil, Sérgio, para muitos, buscar as verdades do mundo espiritual, principalmente os que no corpo físico só pensaram em se divertir. Não é fácil para o orgulhoso imaginar que depois da morte terá de viver ao lado dos pobres que desprezou e muitas vezes labutar por uma ocupação, quase sempre bem longe daquela que gostaria de exercer. Esta semana fomos socorrer um irmão que quando encarnado foi reverenciado pelo equilíbrio e pela inteligência. O seu espírito, ao constatar que se desprendia da matéria, procurava ao seu redor a razão de se manter ainda vivo.

Apesar de ter lido alguns livros sobre a morte, ele a tudo examinava e, ao perceber que do lado espiritual os equipamentos médicos eram quase iguais aos do mundo físico, curioso ficou em conhecer o outro lado da vida. Quando seus familiares vieram dar-lhe as boas-vindas, ele, chorando muito, disse ao pai:

— Por que não se aprende sobre a morte nas salas de aula? Evitaria que o homem errasse tanto. Foram poucos os anos vividos na terra e não sei se os vivi dignamente.

— Meu filho, agora somente sua consciência responderá. Espero que ela não se torne juiz por demais severo.

Aquele espírito, mesmo sendo levado na maca, tinha no olhar a indagação e nos gestos as atitudes de um homem público. Depois de socorrido, pouco tínhamos para fazer ali. Os familiares já esperavam o desencarne, portanto, podíamos retirar-nos, e quando o fazíamos vimos aproximar-se do recém-desencarnado o espírito de uma mulher que ainda tinha a aparência de preta velha.

O nosso amigo, ao reconhecê-la, chorou muito, abraçado a ela, que carinhosamente o amparou nos braços. Era o reencontro num mundo onde todos somos socialmente iguais, só havendo a separação por vibração magnética.

Não é Deus quem nos manda para o “inferno” ou o “purgatório”, mas a nossa consciência, que nos coloca no lugar apropriado às nossas lembranças. Um homem sem caráter não pode ficar ao lado de um que viveu na justiça. Um caridoso não pode viver com alguém que só amou a usura. O famoso irmão foi socorrido, mas não podemos assegurar onde será a sua morada, pois não sabemos o que ele tem depositado no banco da providência divina. Se ele deve muito, terá de trabalhar primeiro em tarefas bem simples para aprender a conviver com a humildade. Mas também pode o irmão ter uma boa cota de belas ações, que o colocará ao lado dos trabalhadores deste País tão amado, junto aos espíritos encarregados de fazer brilhar a estrela de Jesus na pátria brasileira.

Joana foi-se retirando e eu, que não tinha assistido a este socorro, senti-me gratificado pela visita da minha querida irmã. Assim, nós dois, conversando e apreciando a natureza, que é velada por Deus, fomos ao encontro de Deleuze, Edouard e Patrice.

“Muitos dos lírios colhidos na terra trazem ainda nos pés o lodo da imperfeição”. Pensando isso, dirigimo-nos a um hospital da espiritualidade, onde vários recém-desencarnados estavam sendo tratados.

O hospital, em formato redondo, era circundado por palmeiras. Muitos olhos d’água enfeitavam o jardim, onde a cor azul predominava, apesar do prédio ser pintado de branco.

Até as hortências, cravos e rosas me pareciam azulados.

Na portaria, fomos recebidos por Sillos, que conversou muito com Deleuze. A sala de espera apresentava em suas paredes vários quadros de pessoas que nunca vi, verdadeiras obras de arte. Dada a permissão, entramos em um pátio redondo onde uma fonte de águas claras e coloridas borrifava os doentes que ali se encontravam na grama ou nos bancos. Já me impacientava, por não saber o motivo pelo qual ali nos encontrávamos, quando avistamos a doutora Matilde. Muito gentil, convidou-nos para uma visita às enfermarias do Hospital de Lucas.

Eram poucas as camas na enfermaria número um, e nelas dormiam espíritos que davam a aparência de mumificados. Aproximamo-nos. Através da doutora Matilde e outro médico ali encontrado – o doutor Sabá – ficamos sabendo que aqueles irmãos tinham os corpos congelados na terra.

Julgavam-se mortos, apesar do tratamento que vinham recebendo. A cama me pareceu aquecida por várias lâmpadas: ora acendia a azul, ora outro tom de azul, depois a cor-de-rosa, em seguida voltava a azul. Logo após uma lâmpada amarela acendeu no centro cardíaco. Finalmente, voltou a azul. Os espíritos em sono profundo, pareciam “mortos”, porque ignoravam qualquer presença. Passamos pelas camas e observamos todos a dormir um bom sono, Joana comentou:

— Até que deve ser bom a gente desencarnar assim, não é mesmo?

— Eu é que não queria esse desencarne, perda de tempo, e depois, acredito que esses espíritos devem estar sentindo um frio louco. E se fosse na terra e faltasse luz? brinquei.

Edouard, que estava perto de nós dois, sorriu, dizendo:

— Talvez assim voltassem à realidade.

— Eles desencarnaram na Sibéria?

~ Não, congelaram seus corpos para a volta do espírito.

— É mesmo? Coitados, esperam com isso driblar a morte?

— Mais ou menos.

— E os que tomavam sol no jardim?

— São os convalescentes, logo estarão trabalhando.

— Mas dizem que existem muitos que nem desencarnaram ainda. E como se encontram aqui?

— Não sabemos disso. Os que socorremos já desencarnaram. Mas tinham tanta certeza de que não iriam desencarnar que até hoje se julgam congelados.

— Gente tem cada mania…

— Existem propagandas para o congelamento.

— É, o freezer está fazendo sucesso. Não só perus, porcos e galinhas, mas os corpos humanos também estão sendo nele guardados. Sabe, Deleuze, eu senti imensa vontade de tocar naqueles corpos, mas ao me aproximar de um deles senti tanto frio!

Deleuze sorriu, dizendo-me:

— Por isso eles estão no Hospital de Lucas, se não fossem socorridos sofreriam muito mais.

— Gostaria de voltar ao jardim.

— Vamos, lá recuperaremos as energias que dispersamos aqui, junto a esses irmãos.

Ao retornarmos ao jardim, procurei reconhecer alguns dos convalescentes, mas a brisa, o perfume, o sol, o orvalho, tudo era tão digno que a curiosidade se dissipou e eu apenas baixei a cabeça, orando a Deus:

Senhor, eu não sou digno de entrar em Sua casa, mas faça com que meu espírito seja salvo junto àqueles que se distanciaram do Seu coração. Assim seja.

(Irene Pacheco Machado, médium, Luiz Sérgio, Espírito. “Lírios Colhidos”, Brasília: Ed. Recanto, 2006, 10ª ed., cap. XVI, pp. 99-103)