O dirigente espírita

Alexandre Lima

(Pixabay)(Reprodução)

 

A Doutrina Espírita está assentada na moral cristã, na ciência dos fenômenos do espírito e na religião descrita e norteada pela obra de Allan Kardec.

A religião espírita tem como lumiar a Codificação kardequiana, conjunto de obras inspiradas nos Evangelhos e que trazem as premissas de moral, de ciência e de religião que cumpre às Casas Espíritas preservar e divulgar.

Como se tratam de lugares erguidos para uma religião baseada na simplicidade, em que não existem sacerdotes, rituais, sacramentos ou dogmas, as Casas Espíritas têm como papel  propagar a Codificação, o que preconiza exercer atividades de esclarecimento e de doação caritativa, em que o maior de seus valores é imitar Jesus em suas ações de amor ao próximo, de perdão e de consolo aos que sofrem. 

O ponto comum entre as Casas Espíritas não é o mobiliário, nem o uso de tecnologias, nem a estrutura pedagógica de seus cursos, ou ainda a ausência de altares e de ídolos, mas a permanente busca pela capacidade de acolher os simples, consolar os humildes, atendendo os que têm sede de justiça, de verdade, de adiantamento moral e de progresso. Neste sentido, as pessoas que têm papel de liderança nas Casas Espíritas precisam exercer seu trabalho com amor, desprendimento, clareza e simplicidade na transmissão do espiritismo e da verdade espiritual.

O dirigente espírita é uma pessoa comum, a quem cabe uma parcela de responsabilidade dentro da Casa Espírita. Em geral, trata-se de alguém com um pouco mais de esclarecimento doutrinário que os frenquentadores, o que nunca pode ser confundido com uma autoridade religiosa ou sacerdote. Como é uma pessoa encarnada em um mundo ainda de provas e de expiações, trata-se de alguém suscetível a falhas e erros, em aprendizado, apenas acumulando uma posição de temporária liderança, e que deverá prestar contas por seus desacertos e equívocos.

Os esforços dos dirigentes não devem ser para demonstrar sua cultura e erudição, mas antes para acolher os que sofrem, contribuindo para que eles possam seguir com perseverança rumo à fraternidade e ao amor de Deus.

O papel do dirigente espírita é propagar a Codificação, divulgando-a e buscando aplicar suas lições ao dia-a-dia, através de atitudes cristãs, ensinando muito mais através de sua conduta, de bons exemplos, do que pela qualidade de seu discurso ou pelo rótulo de seu cargo.

A responsabilidade do dirigente espírita lhe impõe maior disciplina, em que o cediço do orgulho e da vaidade não podem encontrar espaço em sua conduta.

Todo aquele que lidera em uma Casa Espírita se assenta em posição de maior evidência, que não deve alimentar mazelas morais, como o narcisismo e o culto a sua pessoa em prejuízo dos valores elevados que a Doutrina Espírita deve perpetuar. O dirigente não pode ser confundido com um messias.

É indispensável o aprendizado dos princípios do Evangelho, bem como do estudo da Codificação, construindo um olhar ponderado quanto a todos aqueles a quem cabe chefiar e liderar as tarefas na Casa Espírita, sempre em prol da divulgação da espiritualidade e da evolução moral, nunca nos esquecendo as lições de Jesus, que em suas atitudes demonstrava não estar no mundo para ser servido, mas para servir.

A política à luz da lei de sociedade

(Reprodução)

 

Aristóteles define a política como a ciência do exercício da ética e da busca da felicidade coletiva da pólis. O filósofo grego reconhece que nas comunidades, como nas famílias, as pessoas têm diferentes papéis, mas suas relações devem coexistir de forma harmônica. O legado de Aristóteles reverbera no espiritismo.

O Livro dos Espíritos (1857), obra seminal de Allan Kardec, nas questões de número 766 a 775, aborda a chamada Lei de Sociedade. No breve capítulo, o codificador apresenta as considerações dos espíritos, que afirmam ser imprescindível para a evolução espiritual a vida em sociedade, legado divino para a evolução moral tanto individual quanto coletiva, em que os relacionamentos humanos se contrapõem aos estilos de vida de isolamento, de silêncio e de ociosidade. Aprender a se relacionar com o outro é um traço incontornável da evolução social e espiritual.

Quando refletimos sobre as três revelações, as grandes premissas morais da humanidade, notamos paralelo com o processo de evolução das sociedades. Importa lembrar que o primeiro ordenamento moral para a Doutrina Espírita vem do Decálogo de Moisés, apresentando princípios de relacionamento entre o homem e Deus, e entre o homem e seus iguais, esclarecendo sobre a necessidade de se nortear a vida pelo respeito a Deus e suas leis, e à sanidade moral nas relações em família e em sociedade. Honrar os pais, não matar, não roubar são alguns dos princípios tão importantes como nutrir o amor divino. As lições de Jesus deram novo olhar aos princípios mosaicos, sintetizados no amor a Deus e ao próximo, que, em lugar de restringir, ampliam a acepção do amor para níveis mais universais. A Codificação veio reforçar as bases mosaicas e cristãs, trazendo atualidade às palavras de Jesus, afirmando a potência de seu discurso para a humanidade despertar para a consistência da vida moral, lições  expostas em suas mensagens, como da vida ultrapassando a limitação da experiência material. Os relatos dos espíritos, irmãos nossos em outra esfera de existência, traduzem os efeitos de suas experiências na vida corpórea, muitas  vezes submetidas a dores ante seus equívocos e desatinos morais. 

Não é possível conceber o exercício do amor ao próximo sem a abertura humana à construção de relacionamentos de qualidade com o outro e com a sociedade. Amar ao próximo não se limita em nutrirmos afeição aos nossos familiares ou aos nossos iguais, mas nos exige crescimento para adotarmos a tolerância com todos, inclusive com os que divergem de nossas opiniões.

É uma necessidade humana aprender a amar e viver coletivamente, seja em família, em comunidade, em sociedade, em uma nação ou em um planeta, e esse modo coletivo de vida é fortalecido pelo exercício saudável de princípios éticos e de trabalho consistente pelo bem comum. A vida amadurecida em comunidade exige ultrapassar a separação por bandeiras ou ideologias. Utilizar os princípios mosaicos, cristãos ou espíritas para justificar preconceitos e ações violentas contra os que pensam diferente é se diminuir moralmente e se omitir diante da premissa maior do necessário exercício do amor apregoado pelas principais religiões do planeta. Moisés sofreu por seu povo no Egito, Jesus padeceu ante o império romano, Kardec amargou o antagonismo de seus detratores. A história ensina que as crenças frágeis e seus agentes perecem, como os falsos ídolos, que sempre ruíram ao longo das gerações, mas prevalecem os defensores da verdade das leis divinas, que são incontestáveis e perenes.

As relações sociais estão transpassadas pela política, não as simples denominações partidárias, mas o trato ético entre os cidadãos, em bases legais e republicanas, em que o bem comum deve nortear o estado, suas ações e instituições.

A intolerância é o veneno dos relacionamentos pessoais e sociais, chaga que gera a violência e mina a evolução moral individual e coletiva, retardando a transformação planetária e prestando serviço apenas aos que se nutrem do atraso em suas mais diferentes máscaras.